O São Paulo Film Festival destaca Além de Nós, as Portas, curta-metragem dirigido por Léo Oliveira e Bella Lábegàlini. A obra propõe um olhar para dentro do espaço íntimo das relações familiares, partindo de um enredo simples: uma mãe e uma filha presas dentro de um carro após uma pane elétrica. A claustrofobia da situação não é apenas circunstancial, mas simbólica.
O carro funciona como ventre e caverna, metáfora de um lugar onde as personagens são, ao mesmo tempo, sufocadas e gestadas para um nascimento inevitável. O confinamento se torna terreno fértil para expor tensões silenciosas. A condução narrativa aposta no não dito, nos silêncios que pesam tanto quanto as falas. É nesse espaço comprimido que emergem medos, culpas e frustrações que atravessam gerações. O roteiro e a decupagem foram construídos para valorizar esse embate íntimo, reforçando a ideia de feridas não curadas que se projetam de mãe para filha.
A decisão de filmar as personagens presas em um carro parado surgiu de uma limitação prática que redefiniu a linguagem do filme. Inicialmente, o roteiro previa cenas em movimento, mas a inviabilidade logística levou os diretores a adaptar a história para o veículo estacionado. O que parecia um obstáculo se transformou em um recurso de intensidade dramática, concentrando no espaço fechado toda a força da relação entre as personagens.
O curta dialoga com obras como Lady Bird, de Greta Gerwig, na construção de embates familiares, e com Que horas ela volta, de Anna Muylaert, no tratamento de hierarquias e da autonomia juvenil. As referências, no entanto, não são apenas empréstimos estéticos, mas pontos de partida para a criação de uma obra que encontra sua própria voz ao explorar os silêncios, as pausas e os momentos de suspensão.
As filmagens revelaram curiosidades que acabaram se incorporando à memória da obra. Em pleno calor de quarenta graus, o carro utilizado no set sofreu uma pane elétrica real, impedindo que os vidros fossem fechados. Foi necessário improvisar, chamar o seguro e fazer uma recarga emergencial da bateria para que o filme pudesse ser concluído. A coincidência inesperada fez com que a própria realidade ecoasse o enredo, reforçando a ideia de que a vida, muitas vezes, se confunde com a ficção.
Um aspecto que acrescenta camadas ao curta é o fato de Bella Lábegàlini, além de codirigir, interpretar a personagem Márcia. Sua presença em cena e atrás das câmeras cria uma sobreposição interessante entre performance e concepção estética, ampliando o alcance emocional da obra.
Além de Nós, as Portas reafirma a força do cinema independente brasileiro e convida o público a refletir sobre heranças emocionais que moldam nossas relações.
Título: Além de Nós, As Portas
Formato: Curta-metragem
Gêneros: Ficção
Duração: 8 minutos
Diretores: Leonardo Costa de Oliveira e Bella Lábegàlini
Roteiro: Leonardo Costa de Oliveira
Produtor: Leonardo Costa de Oliveira
Elenco: Bella Lábegàlini (Márcia) e Vittoria Seixas (Joana)
País: Brasil
Bella Lábegàlini – Atriz e diretora
Bella Lábegàlini é atriz de Teatro, Cinema e Televisão. Iniciou sua carreira artística aos 13 anos de idade em São Paulo, onde trabalhou em diversos comerciais. Formada pelo Studio Fátima Toledo, onde vivenciou por 3 anos seu amor por cinema com diversos professores/preparadores como Bruno Danuia, Michelle Boesche, Raissa Gregori, Erick Gallani, Rodrigo Audi, Herberth Vital, Diretor Pedro Casali, Diretor Christian Schneider e Diretor Marcos Mello Cavallaria. Também estudou na escola de atores Wolf Maya em São Paulo com os diretores de teatro Marcelo Marcus Fonseca e Juçara Morais. No Instituto Stanislavisky aperfeiçoou o método do ator, construção de personagens e método Meisner com Arthur Chermont, Bárbara Cury e Vitor Moreno. Estudou na Escola de Teatro Macunaíma, cursou SmartCine onde foi dirigida pelo Diretor Alexandre Klemperer fazendo duas séries. Treinamento na LA Films. Atuou no longa-metragem Trocando as Bênçãos e nos filmes A Banda e Senhoras. No curta-metragem Além de Nós, as Portas integra o elenco e faz sua estreia na direção ao lado do também diretor Léo Oliveira.
Leo Oliveira – Diretor
Leo Oliveira é geólogo, mestre em análise de bacias sedimentares e doutor em geociências. Em 2012 foi laureado pela Sociedade Brasileira de Geologia com a Medalha de Ouro Fernando Flávio Marques de Almeida, pelo melhor artigo de geologia publicado entre 2010 e 2012. Participou com um conto na coletânea independente Sós (2018) e foi finalista do Prêmio Off Flip de Literatura na categoria contos (2021). Ainda em 2021 foi premiado na 6.ª edição do Prémio Literário UCCLA – Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa com o seu romance de estreia, O Sonho de Amadeo. No cinema, atuou como roteirista no curta Trio Promocional de Hambúrger, Batata Frita e Refrigerante (2021), trabalhou no som direto do curta Banheiro de Shopping (2023), estreou como diretor no curta Novo mundo? e atualmente divide a direção com Bella Lábegàlini do curta independente Além de Nós, as Portas.
