
No São Paulo Film Festival deste ano, destacamos Stranded, um curta-metragem dirigido por Luca Floris. O filme acompanha um banqueiro à beira do colapso, consumido pelo estresse, que vê sua vida escapar pelos fios de cabelo que caem diariamente. Sem saber como lidar com a pressão e a sensação de esvaziamento, ele transforma um simples gesto em arte: começa a criar desenhos abstratos com os fios nos azulejos de seu banheiro. O que parecia um impulso banal se torna um ritual catártico e uma porta para sua verdadeira identidade. Stranded é uma jornada silenciosa e visceral sobre a busca por significado e a necessidade de expressão em meio ao caos.
A ideia para Stranded nasceu da própria experiência do diretor, que, em 2023, decidiu abandonar sua carreira no mercado financeiro para seguir o caminho do cinema. A transição veio acompanhada de um período de crise pessoal, simbolizado pela queda de cabelo e pela sensação de perda de identidade. Foi nesse processo que ele encontrou clareza e propósito na arte, e essa vivência serviu como base para a construção da narrativa do filme. Um dos maiores desafios da produção foi transmitir a transformação do protagonista sem recorrer a diálogos ou à expressão facial. O rosto do personagem nunca é mostrado, exigindo que a história fosse contada apenas por meio de gestos, enquadramentos e ritmo. “Era essencial garantir que o público sentisse a angústia e a transformação do personagem apenas pelo que via em tela, sem precisar de explicações óbvias”, explica o diretor. Esse cuidado exigiu uma precisão milimétrica na composição visual, onde cada detalhe — do movimento das mãos à textura dos fios de cabelo — precisava carregar significado.


Visualmente, Stranded remete a obras que exploram narrativas minimalistas e a teoria do iceberg, onde grande parte da história fica subentendida. Uma referência crucial foi Cutaway (2014), de Kazik Radwanski, um filme que nunca mostra o rosto do protagonista, mas transmite suas emoções por meio de suas mãos e dos objetos que toca. Essa abordagem reforça a ideia de que a jornada do personagem não pertence a uma única pessoa — trata-se de uma experiência universal sobre perda de identidade e reinvenção. Mais do que um estudo visual, Stranded convida o público a refletir sobre a capacidade humana de transformar crises em arte. O filme questiona como pequenos gestos e rituais cotidianos podem carregar significados profundos, especialmente em momentos de transição.
Além de dirigir, o cineasta também atuou no filme, o que trouxe desafios inusitados. Um dos principais foi criar, manualmente, as imagens abstratas com fios de cabelo molhados no box do chuveiro — um processo que exigiu paciência e precisão. Como os quadros finais do filme já haviam sido pintados antes das filmagens, foi necessário garantir que as formas criadas com os fios remetessem às pinturas, mantendo a continuidade visual. “Passei horas treinando para manipular os cabelos de forma natural, já que cada imagem precisava parecer espontânea e expressiva”, relembra.
Com uma abordagem sensível, Stranded prova que a identidade pode ser reconstruída de formas inesperadas. Sem dizer uma única palavra, o filme nos convida a olhar para dentro e encontrar sentido naquilo que nos torna genuínos.

Título: Stranded
Produtores: José Eduardo Lins e Luca Floris
Diretor: Luca Floris
Fotografia: Alex Lawson
Elenco Principal: Luca Floris
País: Estados Unidos

Biografia do Diretor: Luca Floris é diretor e roteirista, nascido no Rio de Janeiro, Brasil, onde cresceu surfando e jogando tênis. Formou-se em Física e em Cinema e Estudos de Mídia pela Universidade de Chicago, graduando-se em 2020. Depois, trabalhou por quase três anos com Finanças em Nova York. Em 2023, deixou o mercado financeiro para seguir sua paixão pelo cinema. Como diretor, busca inspiração em suas próprias experiências para criar histórias envolventes e impactantes.